26/07/2017

Da intemporalidade, ou de como tudo está na mesma

“O Sal da Terra” (1954), de Herbert Biberman, é uma obra intemporal. Expõe, na década de 50 tão bem quanto neste século, as desigualdades de raça, de género e de classe através de uma greve de mineiros. Mostra tanto o racismo do insulto verbal quanto o racismo económico, a discriminação existente nas diferentes condições de vida dos trabalhadores americanos e mexicanos, e a luta pela justiça racial e a paridade económica dos trabalhadores mexicanos. Mostra as violações na dignidade dos imigrantes e dos deslocados, o antagonismo entra a produção e a gestão, e o poder quase infindável das classes altas. E mostra, e talvez seja uma das suas características mais notáveis, a luta de um grupo de mulheres, que se liberta das suas amarras (as lides da casa, a opressão dos maridos, a educação das crianças) e luta pelo que considera justo. Mostra, nos olhos de Esperanza Quintero (retratada por Rosaura Revueltas, uma das poucas actrizes profissionais do filme) que a mulher mais bela é a mulher que luta.

"O Sal da Terra" é uma obra intemporal, e um dos maiores traços de genialidade artística é a intemporalidade. As lutas que o filme mostra são guerras que ainda nos faltam vencer: a guerra pela igualdade racial, pela igualdade económica, pela igualdade de género. Esta é a parte triste da genialidade do filme: é que isso não está relacionado com a genialidade de Biberman ou com a análise acutilante e premonitória de Michael Wilson, o guionista. Eles não sabiam que o filme ia fazer sentido 60 anos depois, nem sequer pensaram nisso. Isso está relacionado com um sistema podre que não mudou e que, ainda hoje, é liderado por aqueles que os mineiros e as suas mulheres combateram.