À intransigência do poder austeritário o governo Grego respondeu com a força da democracia, e mostra à Europa, na minha opinião, que é na Grécia que reside o verdadeiro espírito europeu: o da democracia e da justiça social.
Os líderes europeus querem fazer sempre a mesma coisa mas esperaram resultados diferentes. Continuam a pregar a mesma missa que condenou 25% dos gregos ao desemprego, entre os quais metade da população jovem, que condenou o país a 6 anos de recessão, a uma queda do PIB de 25% e a uma dívida estimada de 180% do PIB. E querem-no, a meu ver, por dois motivos. O primeiro é pela cegueira ideológica, pelo credo no fatalismo da austeridade, porque devem acreditar (isto se não tiverem outro interesses não revelados...) que é a diminuir a economia e a empobrecer os povos que se pagam dívidas. Veja-se que mesmo reduzindo brutalmente a despesa e carregando o povo com enormes aumentos de impostos, o défice grego não diminuiu e como tal a dívida continuou a aumentar, matando ainda mais, como se isso fosse possível, uma economia já morta, como notou Krugman. A austeridade falhou, mas não como falha uma bola que vai ao poste. Falhou como falha uma que sai do estádio.
O segundo motivo é por uma questão de sobrevivência política. É que deixar o orgulho de lado e negociar com um governo que foi democraticamente eleito para impor outra coisa que não austeridade comporta mais do que espírito de cooperação: é uma mea culpa e exige uma reavaliação completa a toda a acção da Europa na gestão da crise, numa acção de responsabilização democrática que a Europa nem está habituada nem deseja. É por isso que é preciso punir a Grécia e os gregos, e que, com uma proposta de pegar-ou-largar, a Europa o que queria não era o entendimento mas sim afastar o SYRIZA do governo.
A grande incógnita agora é o referendo. Se não fosse já difícil pela complexidade técnica da questão, a dificuldade aumenta pela pressão a que a Grécia tem vindo a ser sujeita e que vai aumentar exponencialmente. A pressão mediática a favor do "sim" vai ser fortíssima. Vão chamar o medo a sentar-se à mesa da eleição e isso vai decididamente complicar a acção do povo grego. Pode ser um referendo que pode ditar, ou não, o fim do governo Syriza: uma vitória do "sim" põe em causa a legitimidade democrática de um Governo que foi eleito para combater a austeridade, e é por isso que este referendo é um acto de coragem. E é assim que se chega a uma conclusão absolutamente dramática, fruto das vicissitudes da ditadura do poder austeritário e dos tecnocratas: quando optar pela democracia é um acto de coragem algo está tremendamente errado.